ENTREVISTA COM O PROMOTOR DE JUSTIÇA FERNANDO GABURRI SOBRE ACESSIBILIDADE NA ATUAÇÃO PROFISSIONAL

Andrea Burgos de Azevedo Mangabeira e Leila Adriana Vieira Seijo de Figueiredo – Fernando Gaburri

Analista Técnica em Letras na Unidade de Fomento à Pesquisa Científica e Inovação do MPBA. Doutora em Linguística aplicada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Promotor de Justiça do Ministério Público da Bahia. Especialista pela UERN, Mestre pela PUC/SP e doutor pela USP; Professor Adjunto na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. 2º Vice-Presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Diretor da Região Nordeste da Associação dos Membros do Ministério Público de Defesa dos Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência – AMPID.

Promotora de justiça, coordenadora do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça Cíveis, Fundações e Eleitorais – CAOCIFE do MPBA, mestra e doutora em Direito Civil pela a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP e líder do Grupo de Estudos e Pesquisa Cível do CEAF/MPBA

Leia a seguir a entrevista realizada pela Analista Técnica, Andrea Burgos de Azevedo Mangabeira, e pela promotora de justiça, Leila Adriana Vieira Seijo de Figueiredo, com o também promotor de justiça, Fernando Gaburri. Ele é professor e membro da Comissão da Pessoa com Deficiência do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, e fala um pouco sobre sua atuação como promotor de justiça, enquanto deficiente visual no grau de cegueira. Vale lembrar que ele foi aprovado em segundo lugar no concurso do Ministério Público da Bahia, e divide um pouco das conquistas e desafios que perpassam sua trajetória profissional.

Você poderia fazer um breve resumo da sua trajetória profissional?

F.G. Assim que concluí a graduação em Direito, investi na formação acadêmica, cursando mestrado e doutorado em São Paulo. Lecionei, como professor substituto, na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia por quase 2 anos. Fui aprovado no concurso para o cargo de procurador do município de Natal e, em seguida, para professor efetivo da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, permaneci em Natal por quase 11 anos.
Entendi que minha trajetória só estaria completa se ingressasse no Ministério Público. Prestei alguns concursos, fui aprovado em 2, reprovado em outros 2 e abandonei um outro, já na fase da prova oral, em razão de ter iniciado minha atuação no MPBA, em 2020.

Em relação à acessibilidade, houve muitas mudanças desde que o senhor iniciou sua atuação como promotor de justiça? Que fatores o senhor acredita que tenham influenciado essas mudanças?

F.G. A busca pela acessibilidade significa lutar pelo rompimento de barreiras das mais diversas naturezas (arquitetônicas, nas comunicações, atitudinais etc.). Elas, em todas as suas feições, existem em todos os lugares, sem exceção.
Mas, quando conseguimos diminuir as barreiras atitudinais, por consequência, as demais vão, aos poucos, se reduzindo.
Nestes quase 3 anos de atuação como promotor de justiça, penso que consegui, de algum modo, demonstrar aos colegas de MPBA e aos demais atores do sistema da Justiça, que a pessoa com deficiência também pode desempenhar sua função com excelência.
A partir do momento que o convívio com uma pessoa com deficiência deixa de ser algo desconhecido e passa a ser algo corriqueiro, as relações pessoais passam a se tornar cada vez mais naturais e os preconceitos, eventualmente existentes e muitas vezes motivados pelo desconhecimento, aos poucos, cedem lugar à acessibilidade.

Quais os principais desafios enfrentados por um promotor de justiça PCD em sua opinião? E qual seria o principal caminho para a superação desse desafio por parte das instituições públicas?

F.G. O que nos torna pessoas com deficiência não são, exclusivamente, nossas limitações corporais, seja de natureza física, sensorial ou intelectual. É a interação desses impedimentos de longo prazo com as barreiras impostas pela sociedade, que nos impede de exercer, com plenitude e em igualdade de oportunidades, os mesmos direitos garantidos a todos, com ou sem deficiência.   
Penso que o principal desafio seja romper a barreira atitudinal, cujas causas principais acredito ser o preconceito e o desconhecimento.
A partir de quando se torna possível remover (ainda que parcialmente) a barreira atitudinal, as pessoas se convencem a remover as demais, a exemplo de um obstáculo arquitetônico ou a falta de acessibilidade de uma ferramenta em determinado sistema de informação. Elas, de algum modo, passam a fazer o exercício de tentar se colocar no nosso lugar e pensar como fariam diante daquela situação. Quando isso ocorre, essas pessoas tornam-se mais receptivas às reinvindicações concernentes à acessibilidade.   

Como promotor de justiça, qual a sua principal área de atuação? Ou em qual das áreas o senhor mais gosta de atuar?

F.G. Atualmente atuo com Direitos Difusos (meio ambiente, moralidade administrativa e patrimônio público, educação, saúde e discriminação). Confesso que gostaria muito de trabalhar com os direitos das pessoas com deficiência e acredito que, em algum momento, terei essa oportunidade. Enquanto isso não ocorre, tenho atuado como integrante de grupos e comissões ligados ao Ministério Público, que discutem os direitos das pessoas com deficiência, além de proferir palestras por vários lugares do país acerca deste tema.  

O senhor acredita que ser um promotor de justiça PCD oferece ao MPBA ganhos em quais frentes?

F.G. Acredito que o MPBA se torna mais plural tendo em seus quadros uma pessoa com deficiência tão significante, que é a da visão. Em matéria de acessibilidade, acredito que o MPBA, doravante, pode atuar no rompimento de barreiras com conhecimento de causa, por ter em seus quadros um destinatário direto da acessibilidade.
Digo destinatário direto, pois acessibilidade é algo bom para todos, que facilita a vida das pessoas com ou sem deficiência. Ocorre que a pessoa com deficiência sente mais a falta da acessibilidade, ao mesmo tempo que percebe mais a existência da acessibilidade.

Por fim, que conselhos o senhor ofereceria a um bacharel em Direito PCD, aspirante à carreira de promotor de justiça? Existe algum tipo de recurso tecnológico ou sistema que o auxiliou em seu percurso e que poderia sugerir?

F.G. Creio que a presença no MP de um Membro com deficiência seja um fator que permite às demais pessoas com deficiência investirem nos estudos com vistas ao ingresso em uma das diversas carreiras jurídicas.
Hoje ainda somos muito poucos. Uma minoria que, do ponto de vista quantitativo, é proporcionalmente quase insignificante, se considerarmos que aproximadamente 25% da população brasileira tem alguma deficiência.
No caso da deficiência visual, existem os softwares leitores de telas dos computadores e celulares, que possibilitam um excelente acesso à informação.
Com essas e outras ferramentas, a pessoa cega ou com baixa visão, pode ter acesso a materiais de estudo para a preparação para as provas e, uma vez aprovada, poderá utilizá-las no exercício das atribuições do cargo.

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